quinta-feira, 24 de maio de 2012

The answer is blowin' in the wind


      Hoje Robert Allen Zimmerman comemora os seus 71 anos de vida. E isso me fez lembrar, com vergonha, que até agora eu não escrevi sobre o incrível show que ele me proporcionou no dia 24 de abril. Sim, há exatamente um mês. Portanto tentarei agora contar sobre aquela grande noite, onde o mestre Bob Dylan encantou Porto Alegre, calando a boca de todos os que falavam que seu show era chato, que ele era antipático e que sua voz estava horrível.

Bob Dylan em Porto Alegre (Foto: Adriana Franciosi/Agência RBS)


Bob Dylan, Never Ending Tour, 24/04/2012, Pepsi On Stage
Porto Alegre, Pista, R$ 140,00

Bob Dylan - vocal, guitarra, teclado e harmonica
Tony Garnier – baixo
Stuart Kimball – guitarra
George Receli – bateria
Charlie Sexton – guitarra
Don Herron – violino, mandolin, trompete e pedal steel

      A espera era grande. O show foi confirmado há bastante tempo, e os ingressos se esgotaram em apenas três dias. Os que estavam naquela longa fila que vi quando cheguei à frente do Pepsi On Stage eram sortudos, que pensaram rápido e garantiram seu lugar nesse momento histórico. O show começaria apenas às 21h, os portões não abriram antes das 19:30h, e mesmo eu chegando uma hora e meia antes disso, tive que andar muito para encontrar o final da fila. Todos estavam bem agasalhados. Alguns tomavam wiskey e outros vinho. Eu estava apenas com minha camiseta do Jack Daniel’s, bebendo uma ceva bem gelada e comendo um Big Mac. Com frio.

      Mas, não era só dessa esperava que eu estava falando. No meu caso, era mais a espera de uma vida. Sempre sonhei em ver o Dylan. Como comentei em outros momentos, quando meu pai falou que ele já havia tocado no Opinião a uns 15 anos atrás, não consegui nem imaginar o quão incrível seria isso. Ver esse gênio tão de perto. E agora eu teria a chance. Gostaria de ter chego mais cedo, pra ficar mais na frente. Mas, me contatava em estar ali, e já me sentia nervoso. Bob Dylan logo estaria perto de mim.

      Entrando no Pepsi com alguns minutos de atraso, arrumei um bom lugar. Mas, também cometi erros. Deveria ter parado com a cerveja, e não parei. Me acomodei num local perto do teclado de Dylan, onde eu sabia que ele passaria a maior parte do show. Estava realmente perto e tinha uma ótima visão. Mas, também uma bexiga cheia. E no momento em que o show de abertura começou, vi que minha situação era crítica. Nem pude falar mal daquela coisa terrível que foi feita no palco. Uma guria, com uma voz muito boa, mas no maior estilo Maria Gadu, ficou tocando só umas coisas chatas que realmente não acrescentaram em nada na noite. Era melhor ter ficado sem essa.

      No final desse ‘show’, minha vontade de mijar me venceu, e segui em direção ao banheiro. O Pepsi estava completamente lotado, e tive que ir lá pra trás. No momento em que estava mijando, imaginei que não teria chances de voltar ao local perfeito que me encontrava anteriormente. Prometi nunca mais beber em shows e cheguei a ficar brabo com a cerveja. Mas, não desistiria de estar perto do Dylan sem tentar. E fui aos poucos indo em direção as cabeças conhecidas que usei como referência para encontrar o meu lugar. E consegui! Chegando lá a felicidade foi enorme. E eu pedi desculpas a cerveja. Estamos de boa outra vez.

      Bem, agora tudo era Dylan. Faltando 10 minutos para as 21h as luzes se apagaram. E, quando ainda faltavam uns 3 minutos, Robert Zimmerman subiu ao palco, levando o Pepsi a loucura. Sentou-se ao teclado, bem perto de mim, e começou a pouco conhecida Leopard-Skin Pill-Box Hat, um animado blues. Ele vestia uma roupa diferente, bem no seu estilo, e um grande chapéu. Estava alegre, e se mostrava feliz a cada momento em que conseguia levantar o público gaúcho.


      A segunda canção foi uma clássica, mas veio numa versão irreconhecível. Só notei que era It's All Over Now, Baby Blue quando ele proferiu essa frase. Neste momento Dylan já estava na guitarra, em pé no centro do palco. E ai, por mais increça que parível, consegui ter um cara mais alto que eu na minha frente, tapando totalmente minha visão do frontman. Nem tudo eram flores, nem para os mais altos.

      Bob Dylan já tinha tocado piano e guitarra, mas o seu instrumento mais clássico ainda não tinha marcado presença. E quando ele pegou o microfone de gaita e começou Things Have Changed muitos já sabiam que a hora tinha chegado. No primeiro solo de harmônica que ele fez, o Pepsi explodiu! Acho que nem ele e nem ninguém esperavam tanto. Cada vez que ele tocava, era um gol de um time da capital! E ai o cara começou a ficar realmente empolgado. Dançava, sorria, andava pelo palco e até chegava a interagir com o público. Coisa rara no seu show.

      Mas, eu ainda tinha uma cabeça na minha frente que me impedia de ver tudo isso com clareza. Toda a sorte que eu tive parecia ser anulada por isso. Só que tudo mudou quando veio a canção que eu mais esperava no show. Tangled Up In Blue. Outra clássica do Dylan com sua gaita, que mesmo com uma versão diferente, animou o público todo, menos o cara que estava me atrapalhando, aparentemente. Ele decidiu que não queria mais ver o show com aquela visão privilegiada que estava tendo, e saiu. Agora meu campo estava livre, e o show foi se tornando histórico.

      O som no Pepsi era perfeito. Cada toque de guitarra, cada quebrada na bateria, um simples toque no teclado. Tudo era ouvido. Quando um banjo foi tocado, pude ouvir perfeitamente o som que ele faz. Coisa rara. A acústica do local era o meu maior medo, e disso não tenho nenhuma reclamação para fazer. A banda que acompanha Dylan nem preciso falar muito, é óbvio que são grandes músicos. E tem um estilo único, perfeito para acompanhar um cara que sempre foi assim.

      O som de abertura do disco de 2009 do Dylan deu sequencia ao show, Beyond Here Lies Nothin' não tem grande efeito sob o público, mas é uma baita música. Já a que seguiu, foi cantada por muitos. Simple Twist Of Fate é clássica, e mesmo que seja um pouco diferente nos shows, é reconhecida e foi devidamente aplaudida. Outras duas não muito conhecidas, mas sempre muito boas, foram tocadas: John Brown e Summer Days, a primeira dos anos 60 e a segunda da década passada. E ai veio um dos momentos mais bonitos do show, com Desolation Row. Dylan cantou com muita emoção, e foi acompanhado pelo público e por solos de sua banda. Incrível.

      Outro grande momento foi com o hit Highway 61 Revisited, mas que também foi tocada numa versão completamente diferente da original. Poucos conheceram a música antes do refrão. Uma canção dos anos 90 antecedeu o final apoteótico que tivemos. Love Sick não chamou muita atenção, mas foi seguida de Thunder On The Mountain, que mesmo sendo do Modern Times, de 2006, é bem conhecida e foi tocada com muita vontade pela banda. Ballad Of A Thin Man é clássica, e animou bastante os gaúchos. O público cantava e até pulava, e várias vezes puxou o “Dylan, Dylan”, que ecoava no Pepsi e animava bastante o mestre.

      E ficou claro que aquilo que falavam dele ser antipático era uma mentira. Sorria o tempo todo, fazia dancinhas engraçadas e se divertia bastante. E sobre a voz? Claro, não era mais aquela dos anos 60 e 70, mas não estava nem perto de ser ruim! Era como sempre: rouca e sarcástica. Vi o Dylan como eu esperava ver. Um gênio. O gênio que teve a certeza quando puxou os famosos acordes de Like A Rolling Stone, que não precisaria cantar o refrão dessa. O público faria isso por ele.


      Like A Rolling Stone é a grande confirmada do show. E vem na versão clássica, a conhecida por todos. A maioria cantava a letra inteira junto, mas chegando ao refrão, Dylan só precisou puxar o primeiro “How does it feel” pra notar que não seria necessário cantar mais nenhuma parte. O público respondeu aos gritos: “How does it feel. To be on your own. With no direction home. Like a complete unknown. Like a rolling stone?”. Tá, na verdade a perte do “Like a complete unknown” foi trocara por um “Like a rolling stone” que era repetido depois, mas tudo bem.

      Após esse grande momento, o cara apresentou a banda, e trouxe o encerramento com a grande All Along The Watchtower, hit lá de 1967. Um encerramento perfeito. Ele e a banda se posicionaram na frente do palco e fizeram uma incrível pose pra foto, com todo o sarcasmo que Bob Dylan tem. Fez muitos rirem e a maioria esquecer a parte de que ele não gosta de fotos. Nem precisaram sair de cena para o público gritar com muita vontade “Ole Ole Ole Ole... Dylan, Dylan”. E, claro, ele voltou.


     Era a hora da verdade... Queria muito ouvir Blowin' in the Wind, mas ela não tem feito parte do set list nos últimos anos. Porem, em São Paulo ele tocou. Existia uma esperança. E ela se confirmou. A grande balada de Dylan veio numa versão bem diferente, a qual eu já esperava e conhecia, e encerrou de forma perfeita o grande show. Outra vez, antes de sair do palco, os músicos fizeram aquela hilária pose, e foram embora, agora em definitivo.

      Robert Allen Zimmerman, parabéns pelos teus 71 anos e muito obrigado por ter me dado a chance de ver o teu show. Gostaria muito de poder repetir a dose um dia, mas entendo se tu não puder mais passar por aqui. Mas, sei que ainda tens essa capacidade. Muita voz e energia para continuar fazendo shows e animando locais lotados, como estava o Pepsi On Stage mês passado. Claro, eu gostaria de ver mais clássicos. Hurricane, Knockin' On Heaven's Door, I Want You, Joey, The Times They Are a-Changin' e tantas outras, mas a ideia da Never Ending Tour, que Dylan faz desde 1988 é essa mesmo, proporcionar a cada noite um espetáculo novo e diferente. E por fazer isso a tanto tempo e ainda com perfeição, só confirmam que ele é um mestre.

Set List:

(Não, não peguei o set list... apenas encontrei na internet)

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